Caros leitores e leitoras,
O pleito presidencial americano que elegeu George W.Bush em 2000 foi decidido por uma única pessoa - um juiz da suprema corte americana. Naquela votação, cujo placar foi de 4 a 3, decidia-se a validade de um pleito repleto de incidentes e suspeitas de fraude. Assim, um único voto de uma única pessoa decidiu o futuro de centenas de milhões de habitantes do planeta - e talvez, do próprio planeta. O Supremo Tribunal Federal decidiu ontem que a lei da ficha limpa não vale para o pleito 2010, por um placar de 6 a 5. Desta vez, o recém-empossado ministro Luiz Fux, de currículo invejável, desempatou o jogo, tornando-se portanto, moralmente responsável pela validação da eleição de algumas dezenas de eleitos que tem antecedentes civis e criminais nada abonadores, conforme constatados pelo Tribunal Superior Eleitoral. É realmente admirável a coragem de um homem que decide um jogo desta natureza. Mas se por um lado a coragem é admirável, as motivações, não tanto, na minha humilde compreensão. Sem a intenção de promover aqui um debate jurídico, pois não tenho as mais modestas credenciais para tal, pelo menos tentarei trazer outros elementos filosóficos e factuais. Afinal, o que se passa na cabeça dos ministros do TSE e dos 5 ministros do STF que votaram a favor da validade imediata? É simples. Passa-se na cabeça deles a clara compreensão de que entre os princípios constitucionais que regem a administração pública brasileira, está o da moralidade, princípio este tão demandado pela sociedade, e não de hoje. No quarto ao lado deste ambiente, habita o princípio da eficácia da lei, aplicável apenas no exercício seguinte ao da entrada em vigor da respectiva. A questão é que o princípio da moralidade entrou em vigor em 1988, portanto, 22 anos antes de 2010. A lei da ficha limpa é uma mera regulamentação tardia desse princípio. Situação análoga foi a vivida no TSE, quando decidiu pela pertinência do cargo ao partido e não ao eleito, sob acusações de abuso legislativo e interferência entre poderes. Mas o princípio já existia, simplesmente não havia sido invocado nos tribunais até então. Consultado, o TSE posicionou-se pela simples exegese, decidindo por não aguardar a produção legislativa correspondente, que apenas trataria de traduzir em miúdos o princípio já clarificado na carta magna. Assim, entre o moral e o formal, que moram na mesma casa, o ministro Fux decidiu pelo formal, consolidando mais uma vez o poder da letra fria da lei sobre aquilo que poderíamos chamar de "espírito da lei", mais do que ecoado e ressoado por toda a sociedade neste período de nossa história. Assim, a justiça se fez, cega, surda, e fria, presenteando cidadãos de péssimos antecedentes com seus respectivos mandatos, condenados por toda a sociedade. Não faltou testosterona ao ministro. Aliás, eu diria em inglês, "he really fux".
NELSON NISENBAUM
quinta-feira, 24 de março de 2011
Assinar:
Postar comentários (Atom)
Nenhum comentário:
Postar um comentário