quinta-feira, 31 de maio de 2012

MENSALÃO: A SENDA DA FRUSTRAÇÃO.

Não há final feliz possível no tão esperado julgamento do assim chamado "mensalão". E me arrisco a dizer e prever que independentemente do resultado jurisdicional, as consequências deste julgamento serão traumáticas para o país.

Em primeiro lugar, o assim chamado "mensalão" não pertence a uma categoria jurídica, e sim a uma categoria mitológica. Em outras palavras, a parcela da população que deseja ver a carne exposta não será saciada, pois há muito pouca carne a se ver. Em absoluto não haverá prova possível de ser produzida de que políticos receberam verbas "mensalmente" para votar a favor do governo à época dos fatos. Isto só seria possível se houvesse um contrato assinado (sim, isto já ocorreu, por incrível que possa parecer, há algum tempo atrás em uma cidade do grande ABC paulista) vinculando verbas ou favores a votos ou outras promessas. No máximo, o que veremos serão provas de que políticos portavam verbas para as quais não havia provisão formal, os tais "recursos não contabilizdos" de Delúbio Soares, tendo as mais diversas origens, principalmente das relações promíscuas entre empresas privadas e o setor público. Podem ser condenados por sonegação, peculato, prevaricação, improbidade, lavagem de dinheiro, posse ilegal, evasão de divisas, elisão fiscal, e por outros dispositivos legais, éticos, políticos, e assim por diante. Todos estes pressupostos não são capazes de configurar, juridicamente, uma prática sistemática e regular, bem definida, que é o que pretende a aposição mitológica vigente.

As tecnicidades de um julgamento como este porão por terra as teses simplistas evocadas por setores da imprensa e tão ecoadas por setores da sociedade que aparentemente desconhecem o dia-a-dia do brasileiro comum, o trabalhador, o camponês, o pequeno comerciante, os pobres, para quem as prioridades do país são bem outras. Mesmo às categorias ditas mais esclarecidas, o debate jurídico será percebido como estéril, pois a expectativa é de um debate moral, este que guarda uma distância razoável e frustrante do formalismo de nosso sistema jurídico.

Certamente haverá condenações, pelo menos para a maioria dos acusados. Mas não serão condenados pela prática do "mensalão", e sim por outros crimes, o que levará à percepção - ainda que não explícita - de que aquilo não existiu. Ou seja, será uma condenação que "absolverá". Sobre este território, será travada uma sangrenta guerra de mídia, onde as verdades do julgamento serão manipuladas livremente pelos diversos setores, sendo claro quais serão aqueles que sacrificarão a lógica e a inteligência para ressuscitar o mito dos escombros dos autos e juízos.

Das condenações poderão derivar processos ético-disciplinares nas instâncias partidárias e camerais, o que multiplicará o factóide como areia em um deserto, o que em outras palavras, significa muita fumaça e breve esquecimento. Sim, por que o país precisa andar, e sob o ponto de vista econônico-financeiro, os autos revelarão a irrelevância dos montantes envolvidos para o cenário econômico nacional, o que levará as pessoas que acompanharem de perto este processo a perceber que estão assistindo a uma tempestade em uma banheira doméstica.

A eventualidade de um julgamento mais "duro" por parte do STF traria o país a uma curta distância de uma grave crise institucional, e tenho a convicção de que aquela instância máxima tem em seu inconsciente coletivo esta clareza, e provavelmente não assumirá esse risco.

Sem a menor dúvida, este julgamento terá um forte componente político e partidário, e a percepção que isto causará na nação será bem desagradável e contrariará expectativas de setores de muita força de opinião.

Por fim, tenho o convencimento de que o eleitor médio tem a clara percepção da irrelevância dos eventuais crimes cometidos em face do grande cenário nacional e internacional, no qual o país cresceu e continua crescendo, ganhando respeitabilidade, no ganho de autoestima da população em geral durante o governo Lula. Concluirá com tranquilidade que todo este processo não passou de uma gigantesca "briga de comadres".

Como disse uma vez o poeta português, "tudo isso existe, tudo isso é triste, tudo isso é fado...". E o Brasil continuará vivo. Mas suas instituições sangrarão neste processo. E com toda a franqueza, penso que não há resultado possível deste julgamento que vá contribuir para qualquer avanço do país. Perto do que já vimos como grandes escândalos de corrupção, este é um caso de ladrões de galinhas. E na lógica atual do sistema político-partidário, é apenas a própria lógica.