Não há final feliz possível no tão esperado julgamento do assim
chamado "mensalão". E me arrisco a dizer e prever que independentemente
do resultado jurisdicional, as consequências deste julgamento serão
traumáticas para o país.
Em primeiro lugar, o assim
chamado "mensalão" não pertence a uma categoria jurídica, e sim a uma
categoria mitológica. Em outras palavras, a parcela da população que
deseja ver a carne exposta não será saciada, pois há muito pouca carne a
se ver. Em absoluto não haverá prova possível de ser produzida de que
políticos receberam verbas "mensalmente" para votar a favor do governo à
época dos fatos. Isto só seria possível se houvesse um contrato
assinado (sim, isto já ocorreu, por incrível que possa parecer, há algum
tempo atrás em uma cidade do grande ABC paulista) vinculando verbas ou
favores a votos ou outras promessas. No máximo, o que veremos serão
provas de que políticos portavam verbas para as quais não havia provisão
formal, os tais "recursos não contabilizdos" de Delúbio Soares, tendo
as mais diversas origens, principalmente das relações promíscuas entre
empresas privadas e o setor público. Podem ser condenados por sonegação,
peculato, prevaricação, improbidade, lavagem de dinheiro, posse ilegal,
evasão de divisas, elisão fiscal, e por outros dispositivos legais,
éticos, políticos, e assim por diante. Todos estes pressupostos não são
capazes de configurar, juridicamente, uma prática sistemática e regular,
bem definida, que é o que pretende a aposição mitológica vigente.
As
tecnicidades de um julgamento como este porão por terra as teses
simplistas evocadas por setores da imprensa e tão ecoadas por setores da
sociedade que aparentemente desconhecem o dia-a-dia do brasileiro
comum, o trabalhador, o camponês, o pequeno comerciante, os pobres, para
quem as prioridades do país são bem outras. Mesmo às categorias ditas
mais esclarecidas, o debate jurídico será percebido como estéril, pois a
expectativa é de um debate moral, este que guarda uma distância
razoável e frustrante do formalismo de nosso sistema jurídico.
Certamente
haverá condenações, pelo menos para a maioria dos acusados. Mas não
serão condenados pela prática do "mensalão", e sim por outros crimes, o
que levará à percepção - ainda que não explícita - de que aquilo não
existiu. Ou seja, será uma condenação que "absolverá". Sobre este
território, será travada uma sangrenta guerra de mídia, onde as verdades
do julgamento serão manipuladas livremente pelos diversos setores,
sendo claro quais serão aqueles que sacrificarão a lógica e a
inteligência para ressuscitar o mito dos escombros dos autos e juízos.
Das
condenações poderão derivar processos ético-disciplinares nas
instâncias partidárias e camerais, o que multiplicará o factóide como
areia em um deserto, o que em outras palavras, significa muita fumaça e
breve esquecimento. Sim, por que o país precisa andar, e sob o ponto de
vista econônico-financeiro, os autos revelarão a irrelevância dos
montantes envolvidos para o cenário econômico nacional, o que levará as
pessoas que acompanharem de perto este processo a perceber que estão
assistindo a uma tempestade em uma banheira doméstica.
A
eventualidade de um julgamento mais "duro" por parte do STF traria o
país a uma curta distância de uma grave crise institucional, e tenho a
convicção de que aquela instância máxima tem em seu inconsciente
coletivo esta clareza, e provavelmente não assumirá esse risco.
Sem
a menor dúvida, este julgamento terá um forte componente político e
partidário, e a percepção que isto causará na nação será bem
desagradável e contrariará expectativas de setores de muita força de
opinião.
Por fim, tenho o convencimento de que o eleitor
médio tem a clara percepção da irrelevância dos eventuais crimes
cometidos em face do grande cenário nacional e internacional, no qual o
país cresceu e continua crescendo, ganhando respeitabilidade, no ganho
de autoestima da população em geral durante o governo Lula. Concluirá
com tranquilidade que todo este processo não passou de uma gigantesca
"briga de comadres".
Como disse uma vez o poeta português,
"tudo isso existe, tudo isso é triste, tudo isso é fado...". E o Brasil
continuará vivo. Mas suas instituições sangrarão neste processo. E com
toda a franqueza, penso que não há resultado possível deste julgamento
que vá contribuir para qualquer avanço do país. Perto do que já vimos
como grandes escândalos de corrupção, este é um caso de ladrões de
galinhas. E na lógica atual do sistema político-partidário, é apenas a
própria lógica.
quinta-feira, 31 de maio de 2012
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