terça-feira, 30 de novembro de 2010

No cinema é tudo mágica...

Caros leitores e leitoras,

Tenho o costume de ouvir e ler o máximo que meu tempo permite, e nesta empreitada, todas as fontes e origens são consideradas, independentemente do lado em que estão. Uma das fontes que não deixo de ouvir, é o Arnaldo Jabor, em seus comentários quase diários na CBN. Está certo que fico triste quando ele fala mal do nosso presidente, mas acho importante saber quais são as suas razões, como as de qualquer um que pense diferente de mim. Mas nos últimos dois dias algo curioso aconteceu. Jabor comemora efusivamente o sucesso das operações policiais e militares no Rio de Janeiro, faz elogios, afagos, e assim por diante. Mas parece que ele esqueceu algumas coisas, não sei se por problema de memória ou mesmo de avaliação. O que ocorreu no Rio foi apenas um (talvez de outros) ponto culminante de um processo que foi gestado no governo federal, sob o ministério de Tarso Genro, e que se chama PRONASCI. Trata-se de um conjunto de políticas de fortalecimento do estado nas áreas que governos anteriores fizeram questão de esquecer que ali vivia gente. Dentro deste conjunto que envolvia obras, infraestrutura, e outras intervenções, o apoio financeiro às iniciativas que levaram à implantação das UPP's, cujo valor estratégico foi agora definitivamente provado. Por último, o apoio incondicional que foi dado pelas forças armadas. Então, Sr.Jabor, você que tanto falou mal do presidente e dos sindicalistas e bolchevistas que o rodeiam, nas suas palavras, tem a obrigação moral de estender suas efusivas homenagens a esses mesmos, que revolucionaram a visão de estado nos últimos anos, aos verdadeiros estadistas e ao seu grande líder consagrado, o presidente Lula. Se não o fizer, vamos ficar desconfiados que o senhor trata o mundo real como se estivesse eternamente na sua cadeirinha de diretor de cinema, que aliás, confesso admirar. Claquete!

NELSON NISENBAUM

segunda-feira, 22 de novembro de 2010

Pode ser bom sinal!

Caros leitores e leitoras,

A notícia publicada na semana passada dando conta de uma redução do número de leitos hospitalares no Brasil, detectada pelo IBGE deve ser analisada com cuidado, pois envolve um sem número de variáveis que estão muito acima da lógica econômica e contábil, lógica esta tão surrada pela grande mídia, que mais uma vez não perdeu a oportunidade de alfinetar as gestões públicas. A referida perda foi da ordem de 11.000 leitos, e como disse, pode ser a resultante de múltiplos processos e condicionantes.

Nas últimas décadas o Brasil passou por uma imensa transformação no seu sistema de saúde. A implantação do SUS - a maior política social em curso no mundo ocidental - ainda que incompleta, mudou paradigmas e cada vez mais se impõe como antítese do modelo hospitalocêntrico. Talvez a reforma psiquiátrica seja o maior expoente dessa nova visão, mas não é a única. O avanço da gestão e a melhoria das práticas gerenciais promoveu, sem dúvida, uma racionalização de recursos além de sua otimização. Permeando essa complexa malha, os avanços do conhecimento médico, a democratização do acesso a esses recursos e o crescimento das estruturas de atenção básica também contribuem para a redução da necessidade de leitos hospitalares. Muitas condições que há 10 ou 20 anos geravam internações frequentes, não mais o fazem, justamente pela melhora da assistência em todos os níveis.

Políticas alternativas de internação domiciliar, atendimento domiciliar, associados aos processos regulatórios em implantação também contribuem nesse sentido. O município de S.Bernardo do Campo vive um momento com estas características, e muito embora persista uma necessidade de leitos para o SUS, há um ganho substancial de eficiência dos leitos instalados bem como de sua gestão.

Um outro ponto que pode desempenhar um papel importante neste fenômeno, é a expansão dos processos de auditoria interna no SUS, que com boa dose de certeza, contribui no sentido de se desestimular as más práticas adminstrativas, mais frequentemente encontradiças nos ambientes de maior complexidade, como é o hospitalar.

Mesmo não sendo especialista ná área de gestão de saúde, minha experiência aponta para esses possíveis bons significados de algo que em uma análise mais superficial é percebido como perda. Na minha modesta visão, podemos sim, estarmos diante de um fenômeno com significados positivos.

NELSON NISENBAUM


quarta-feira, 17 de novembro de 2010

BANALIZAÇÃO PERIGOSA

Caros amigos, amigas, leitores e leitoras,

Alguns termos de nossa língua permitem usos e interpretações que frequentemente levam a sofismas (raciocínios incorretos), mas talvez, poucos como o termo "preconceito". Rigorosamente, preconceito é tão somente uma idéia, que habita o íntimo da pessoa, e trata-se de um conceito ou juízo pré-concebido, ou seja, um juízo que precede a apreensão e o termo, fases iniciais do raciocínio. Portanto, podemos dizer que o preconceito é o antirraciocínio, ou o que contraria as leis da lógica, pelo menos da aristotélica.

Atitudes violentas e deploráveis, como por exemplo as perpetradas pelo nazismo no século XX e outras agressões como por exemplo a recente ocorrida na Avenida Paulista (S.Paulo/SP), onde homossexuais foram espancados, são por vezes atribuídas ao "preconceito" contra este ou aquele. Aqui, confunde-se preconceito com ódio e agressão, estas sim, atitudes orientadas e dirigidas, volitivas, e portanto, fora do campo das idéias, e pertinentes ao campo das ações.

Ninguém pode ser condenado por ser preconceituoso. Na verdade, todos nós somos. O tal "conceito", ou o juízo formado, é atitude do intelecto resultante da aquisição de informações do meio, da simbolização mental consequente e da formulação lógica e ética. Se admitirmos por definição que ninguém é capaz de apreender toda a realidade sobre algum assunto ou fato, rapidamente verificaremos que temos mais preconceitos do que imaginamos.

Também não pode ser condenado aquele que diz "não gosto de marcianos", mesmo que seja a mais preconceituosa das assertivas. Todos fazemos escolhas na vida, por critérios declarados ou não, continuamente, e a maioria delas, por preconceitos. Totalmente diferente é a realidade de quem diz: "os marcianos não devem ter os mesmos direitos que nós". Aqui, estamos tratando de discriminação e violência institucional. Sobre a "morte aos marcianos", já discutimos acima.

Penso que temos que tomar o devido cuidado com os recentes fatos e narrativas do último processo eleitoral no Brasil, onde inúmeras ações e violências institucionais ou não, foram atribuídas a preconceitos. Em inglês solene, bullshit! O que vimos em todos os campos - políticos, religiosos, regionais, sexuais, etc - foi ódio, o mais puro ódio. Nada contra a disputa política, que invariavelmente acirra ânimos, mas tudo contra a banalização quase infantil que se comete ao atribuir tamanha violência àquilo que faz parte de nós, cotidianamente. No caminho inverso, outra violência é cometida contra aquele que diz "não gosto" e é taxado de preconceituoso. E por acaso somos obrigados a gostar de tudo e de todos? O débito da ética democrática é o do respeito (também confundido com tolerância) e da capacidade de compartilharmos os espaços concretos e abstratos com aquilo ou com quem não gostamos, pressuposto básico da vida em sociedades estáveis.

É claro que determinados conjuntos de preconceitos compartilhados por determinados conjuntos de pessoas podem incitar o ódio e a violência, mas para que isso ocorra, tais grupos devem ter como catalisadores um conjunto de concepções culturais e éticas devidamente cultivados e transmitidos pelos processos educativos da sociedade, e introjetados e percebidos como "científicos", quando na realidade, são dogmáticos. E é no campo dos conflitos inconscientes entre dogmas e ciências que encontramos a pólvora que pode jogar a democracia e a humanidade pelos ares.

NELSON NISENBAUM
S.Bernardo do Campo, 17 de novembro de 2010.